21 agosto, 2006
Sugestão literária

O livro chama-se Conquistadores de Almas, o seu autor, Pinto de Sá, um professor do Técnico e a editora é a Guerra e Paz, uma casa nova que se vem juntar a uma nova leva como a Aletheia e a Tinta da China.
Esta obra autobiográfica e memorialista (género em franco desuso entre nós, vá-se lá saber porquê...), conta-nos a experiência do autor enquanto militante de extrema-esquerda nos últimos 4 anos de "marcellismo", ao serviço de Comités Revolucionários. Pinto de Sá foi preso e torturado pela PIDE. É relativamente impactante o relato das torturas às mãos da polícia política que Pinto de Sá bem descreve.
Mas porventura o que de mais interessante o livro terá é o que se vem a passar a seguir. O futuro professor do IST, depois da revolução, é preso novamente, desta feita por esse grande órgão da nossa legitimidade democrática que foi o COPCON. Sabemos que não foi o único português que terá sido preso por essas duas sinistras instituições, a PIDE e o COPCON. Se querem a minha opinião, quem quer que o tenha conseguido não pode ser inteiramente má rez...
Mais interessante esta parte do livro, dizia eu, porque é uma fase da nossa história contemporânea de que os viventes não gostam de falar muito (especialmente os que eram poder na altura. De novo, vá-se lá saber porquê...).
Há dados deliciosos que a nossa história mais recente teve o democrático cuidado de fazer desvanecer: por exemplo, que enquanto os presos políticos do antigo regime rondavam, por alturas de Abril de 1974, as três centenas, os presos políticos do "novíssimo príncipe" rondavam também os três... milhares. Por exemplo, que a extrema-esquerda, talvez fruto das suas ambições democráticas e do seu provado amor aos direitos humanos, promovia e incitava à execução pública dos "fracos" e dos "traidores" (havia uma diferença substancial...) que haviam delatatado à PIDE. Por exemplo, que o "assassinato" de Ribeiro dos Santos, esse grande ícone mural do MRPP, não foi propriamente uma vítima inocente e pacífica da DGS. Por exemplo, que à falta de uma "culpa" jurídica os presos eram culpados porque, evidência das evidências, estavam... presos. Enfim, não sendo propriamente a última novela de uma Rebelo Pinto o relato de Pinto de Sá consegue, ainda assim, fazer-nos pensar nas voltas que "isto" foi dando nas últimas três décadas.
Factor preponderante a ter em conta é que todo aquele "esquerdalho" do marcellismo e do PREC já veio a público lapidar o bom Pinto de Sá. Tudo porque o homem denunciou, tal como muitos dos seus "compagnons de route" denunciaram. Mas também, e acima de tudo, porque ele admite que denunciou e afirma que muitos deles também denunciaram e traíram.
E afinal de contas, se essa gente anda toda irritada alguma coisa de bom deve ter o livro...